Revitalização de Espaço Público

Projeto Cidade Educadora: revitalização de espaço público

No ano de 2014 iniciamos um projeto de cuidado da praça em frente a nossa escola. Em meio ao descaso da limpeza pública do município, nós (re)agimos, e iniciamos nossa ação social com a limpeza da praça.

Em 2015, demos mais um importante passo e decidimos juntamente com os alunos e familiares transformar este “limão” do abandono em que se encontrava nossa cidade, em uma “limonada” saborosa de educação, amor e cidadania para nossos jovens. Nascia no Centro de Estudos Júlio Verne o Projeto Cidade Educadora.Na verdade o Projeto Cidade Educadora …começou como um movimento, em 1990, com base no I Congresso Internacional de Cidades Educadoras, realizado em Barcelona, quando um grupo de cidades representadas por seus governos locais, pactuou o objetivo comum de trabalhar juntas em projetos e atividades para melhorar a qualidade de vida dos habitantes, a partir da sua participação ativa na utilização e evolução da própria cidade (MEC, 2011).
O princípio básico de uma cidade educadora é “aprender na cidade, com a cidade e com as pessoas da cidade” (MEC, 2011).
Um belíssimo exemplo é a cidade de Rosário, Argentina. A cidade promoveu transformações urbanísticas e colocou em prática projetos para criar espaços públicos de convivência, com a aproximação entre educação, saúde e cultura (CIDADE EDUCADORA, 2018).
Para os idealizadores do Projeto Cidade Educadora, as escolas desde o século XIX tendiam a concentrar todas as atividades num único lugar, mas no século XXI isto não cabe mais. Para eles o presente momento exige que a educação transcenda as paredes das salas de aula. A ideia principal é seguir os passos da cidade de Rosário – Argentina, ou seja, buscar na revitalização dos espaços públicos uma extensão das salas de aula. O ambicioso projeto prevê que tudo na cidade seja pensado para que os estudantes possam viver o entorno das escolas como locais de aprendizagem e cidadania. O projeto privilegia a história, as artes, a música e a natureza (CIDADE EDUCADORA, 2018).
Em 2015 iniciamos uma grande limpeza da praça, envolvendo todos osalunos e alunas, bem como toda equipe do Júlio Verne. Em 2016 pintamos os muros da praça, instalamos lixeiras, implantamos a limpeza diária e troca de sacos de lixo, bem como o cuidado em cortar o mato e o incentivo ao plantio de árvores no espaço (com a devida autorização da prefeitura naquela data), como processo desta revitalização (continuamos com essa manutenção até hoje).

Em 2017, as borboletas transformaram a praça numa verdadeira maternidade de casulos. Foi um espetáculo da natureza. Naquele ano nossos alunos experienciaram as aulas de biologia em plena praça, rodeados de casulos e borboletas.
O ano de 2018 foi muito especial. Primeiramente porque a praça se
transformou num lugar de inspiração poética, depois porque um grupo de mães resolveu juntamente com a escola, montar um bazar do consumo sustentável, para arrecadar recursos para ampliarmos nossa ação social na praça.

O Bazar foi um sucesso, naquele ano conseguimos os recursos necessários para um projeto mais ambicioso: revitalizar a quadra poliesportiva (que pertence a praça). A quadra pública da praça não possuía tabela de basquete. O único esporte realizado ali era o futebol. Nosso ambicioso projeto em 2019 através dos recursos do bazar e da participação financeira do nosso Centro de Estudos conseguiu comprar tabelas de basquete, aros flexíveis oficiais, contratar serralheiro que revitalizou o suporte das tabelas de basquete, um pintor que nos auxiliou na pintura e delimitação das mais diversas modalidades.

Numa tarde de junho de 2019, nossa equipe concluiu a instalação das tabelas, a pintura e plantou a semente do basquete na região.

Uma semente de amor, cuidado e preservação foi lançada. Talvez muitos não acreditem nos frutos de um trabalho como este, mas nossos alunos foram os primeiros a enxergarem os brotos do maracujá, a tomarem o seu delicioso suco, a verem aqueles primeiros jovens chegando com suas bolas de basquete, suas roupas típicas do esporte e suas caixas de som, dando os primeiros arremessos depois de mais de 30 anos sem a prática do esporte no local.
No final de 2020 e início de 2021, tivemos a alegria de ver a comunidade assumindo o espaço revitalizado e se apropriando do lazer agora disponível. Numa ação conjunta: Prefeitura de Diadema, Projeto One Fire e comunidade, o espaço foi totalmente pintado com as cores do novo projeto, os eventos e campeonatos começaram acontecer e a manutenção do local passou para o encargo destes. Definitivamente o basquete voltou com toda a sua força para a região. O sonho do Centro de Estudos Júlio Verne foi concretizado.
Quando iniciamos este projeto em 2014 em meio à sujeira, e o abandono, a revitalização da praça era apenas uma esperança. Hoje, alguns anos depois, ele já é uma realidade. Quem não acredita na revitalização deste espaço? Quem não acredita que nosso país também pode ser revitalizado? Através deste exemplo de esforço, iniciativa e dedicação, podemos acreditar que os frutos do empenho, estudo e trabalho serão alcançados. Podemos começar a acreditar, que se depender destes alunos e profissionais, ninguém segura nosso país, e também a nossa praça. “Nossa praça”, nosso país, será um local de plantio, crescimento, dedicação, cuidado, amor e muitos, muitos frutos.
O Projeto Cidade Educadora não termina nunca. Nossos alunos a cada dia, a cada semana, são levados a circularem nas ruas que circundam a escola. São conduzidos para nosso Centro Cultural, vendo o trabalho da floricultura, da escola de gastronomia, do sapateiro, do correio. Nesta travessia, os problemas da cidade não são escondidos, mas percebidos. A beleza da Feira Livre e o delicioso pastel não são esquecidos, o preço das frutas e verduras são anotados e o pastel saboreado.

Considerações finais

Portanto existe uma oportunidade de aprendizado no entorno das escolas, que não está sendo aproveitada. Crianças e jovens que vivem na sua maioria em apartamentos e condomínios, pouco ou quase nada sabem sobre o funcionamento de uma cidade. As crianças não possuem lugares e espaços para experimentar os desafios e alegrias da realidade cotidiana. Sendo assim, a educação não pode desconsiderar estes saberes escondidos na realidade cotidiana (FREIRE, 2017, p. 79).
A ideia é usar os saberes disponíveis na cidade, para complementar os princípios e conceitos adquiridos em sala de aula. O exemplo bem-sucedido da cidade de Rosário na Argentina (CIDADE EDUDADORA, 2018), e do Centro de Estudos Júlio Verne em Diadema/SP, pode e deve ser imitado.
Desta forma, os espaços comerciais, artísticos e culturais seriam incluídos na realidade estudantil. O intuito deste projeto como já mencionamos é “aprender na cidade, com a cidade e com as pessoas da cidade” (MEC, 2011).
É obvio que para implantar estes princípios de exploração do entorno das escolas, se faz necessário uma equipe de monitores preparados e treinados, que acompanham a professora com seus alunos nesta tarefa. Sair da sala de aula já é uma aventura para os alunos, sair da escola e andar pelas calçadas, ruas e praças é quase como uma expedição em busca de tesouros escondidos (FREIRE, 2017, p. 79).
A formação deve abordar o contorno geográfico da escola, do professor e do educando (FREIRE, 2017, p. 133-134). Embarcar nesta aventura é um motivo para alegria e para festa do saber (PIEPER, 1974, p. 32; LAUAND, 2012, p. 33), sair pelas ruas explorando cada saber que vai sendo “desnudado” (FREIRE, 2017, p. 79).
Como diz Paulo Freire, é preciso ir lendo o mundo, identificando o contexto em que as pessoas vivem. Assim vou coletando e colhendo os saberes. É a “explicação do mundo”, que está escondido nos saberes populares. Segundo Freire, se faz necessário a “leitura do mundo”, que precede a “leitura da palavra” (FREIRE, 2017, p. 78-79).
Os educadores precisam pensar as ruas, os teatros, as escolas de dança, como território educador. Quando a criança anda pelas ruas no entorno da escola, e ela vê um adulto trabalhando, vê um vendedor ambulante, presencia um protesto, uma manifestação, ela vê uma sociedade real, e se encanta pela cidade que vive. Os parques da cidade são espaços de contemplação, de lazer, de trabalho, e de aprendizado. Afinal o Ser se humaniza e vai humanizando o mundo através da comunhão humana (FREIRE, 1977, p. 5-6). Nesta travessia educadora se constrói um (ser)humano (CIDADE EDUCADORA, 2019).

Prof. Dr. Alexandre Medeiros

Pós Doutorando em Educação na Universidade de São Paulo – FEUSP Diretor Acadêmico do Centro de Estudos Júlio Verne

Referência Bibliográfica:

CIDADE EDUCADORA. SECRETARIA DA CULTURA E EDUCAÇÃO DA CIDADE DE ROSÁRIO – Argentina – Cidade Educadora. Canal Futura. Escolas Inovadoras – Publicado em 05 de set de 2018 – https://www.youtube.com/watch?v=3PpyBbrcqpE – acessado em 05/09/2019

CONGRESSO CIDADES EDUCADORAS – 1º. Encontro Insper Cidades Educadoras – 30/11/2019 (Dia Internacional das Cidades Educadoras)

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, Rio de Janeiro & São Paulo: Paz e Terra, 2017

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, Rio de Janeiro/RJ: Paz e Terra, 1977

LAUAND, Jean, Abalo filosófico e afins. Por uma Pedagogia da Admiração, International Studies on Law and Education 10 jan-abr 2012, CEMOrOc -Feusp/IJI-Univ. do Porto, 2012

MEC, Ministério da Educação – Cidades Educadoras – http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&a
lias=9272-apresentacoes-rede-brasileira-cidades-educadoraspdf&category_slug=outubro-2011-pdf&Itemid=30192 – acessado em 13/11/2019 – Projeto de outubro de 2011

PIEPER, Josef. Una Teoria de la Fiesta. Madrid: Ediciones Rialp, 1974

UNESCO – United Nations for Educational, Scientific and Cultural Organization – https://www.julioverne.com.br/unesco/unesco – acessado em 04/12/201

2014

2015

2016

2017

2018

2019

2020

2021